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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Parte VII

Parte 7 - Xadrez e a política

WY - Sobre comunismo, uma análise de sociedade com o xadrez pode se encaixar nisso. Desde que acabou a União Soviética, começa a perder destaque no Brasil e também em alguns outros países. O xadrez na URSS tinha essa situação entre Karpov e Kasparov cada um com uma orientação política. O Karpov era aberto ao comunismo e o Kasparov era mais adepto a Perestroika de Gorbatchev...

HC - Isso mesmo.

WY – Qual seria a dimensão a qual xadrez e a política se abraçam?

HC - Sempre! Aliás, todo substrato desse livro é exatamente isso. O xadrez e a política sempre andaram de mãos dadas. Desde a sua invenção: ele é inventado na Índia, aí ele é introduzido pelos árabes na península Ibérica. Quem é que na península Ibérica vai jogar xadrez em primeiro lugar? Os padres e os monges. Eles ficavam naqueles conventos, não tinham nada para fazer.
      O filme "O nome da rosa" mostra isso muito bem. Quando vem as "Cruzadas", começa a haver uma disputa ideológica do xadrez. Por quê? Porque o xadrez, como ele era jogado entre os árabes, era outra regra do que é hoje. O bispo, não era bispo, era elefante. A dama não era dama, era o grão-vizir. Os movimentos eram diferentes. Começa uma guerra ideológica logo de cara: quer dizer, os cristãos não podiam jogar xadrez igual aos mouros. Por isso foi proibido jogar xadrez à moda antiga, inventaram regras novas.                  
      Mas não dava para proibir, porque já estava espalhado nos conventos, até santo jogava: Santa Tereza D'Ávila gostava de xadrez. E o 1º grande jogador de xadrez foi um bispo: Dom Ruy Lopez de Segura, por isso até hoje a abertura mais antiga do xadrez se chama Ruy Lopez ou Espanhola, por causa desse bispo. Depois o xadrez foi utilizado como um exemplo durante o Iluminismo, principalmente pelo Rousseau (Jean Jacques Rousseau, pensador do Iluminismo e amante do jogo de Caíssa), de mostrar como a própria sociedade poderia e deveria se organizar de uma maneira mais livre e menos sobre o poder absolutista dos reis. O xadrez também teve um papel importante na Revolução Francesa.


Parte 8 - Xadrez e as revoluções


WY – E na Revolução russa?

“O xeque-mate é fruto de todas as peças que se desenvolvem."

      E depois culminou com a Revolução Russa, de 17. Por quê? Porque o xadrez já era popular na Rússia por conta do frio, naquele inverno super rigoroso, quer dizer, jogar xadrez já fazia parte da cultura do povo russo. Muitas pessoas jogavam.
      O xeque-mate é fruto de todas as peças que se desenvolvem. Quando o Lênin percebeu isso ele passou isso em termos do marxismo para a própria análise do desenvolvimento das forças sociais. Quem são os “peões” que o Lênin moveu? A classe operária, e os escritores que simpatizaram, tudo isso aí você pode imaginar como uma engrenagem de peões, cavalos, bispos e torres que se moveram no tabuleiro da vida, no tabuleiro da história. E quando eles tomaram o poder, aquela sociedade, aquela coisa interessante foram o seguinte: como eles iam construir o socialismo? Industrializar o país? Que era muito atrasado, a classe operária, muito pequena e a maioria do povo era completamente ignorante. O índice de analfabetismo era enorme... A Rússia era dos países mais atrasados da Europa, não é? Não era tão avançado como a França, que já tinha passado por uma revolução francesa, iluminista, da enciclopédia, por uma série de coisas, da educação laica nas escolas e tal. Então tinha uma gigantesca massa de camponeses que era completamente ignorante e analfabeta. E então precisava dar um salto de qualidade para industrializar o país. Primeiro porque esses camponeses precisavam começar a operar máquinas, tinham que começar a atuar politicamente na sociedade. Foi aí que o Lênin e os demais bolcheviques, resolveram, em 1923, utilizar o xadrez como um movimento para queimar etapas, por exemplo, ajudar mentalmente a construção do povo atrasado, no sentido dele ser preparado com mais rapidez para a alfabetização, para estudar, enfim, para se abrir uma mente mais aberta a absorção do conhecimento, né? Então, a ligação do xadrez com a sociedade é total.

P – E sobre a revolução cubana?

      A última delas foi a revolução cubana, onde o Che Guevara já gostava de jogar xadrez na Argentina, que sempre foi um país onde o xadrez foi muito desenvolvido e aí foi um bocado curioso, porque em 1939, o torneio das nações ou Olimpíadas de Xadrez foi em Buenos Aires e quando estava no auge desse torneio estoura a 2ª Guerra na Europa. A 2ª Guerra Mundial. Aí os principais jogadores dos países desenvolvidos não queriam voltar para lá para serem mortos, muitos inclusive eram judeus, como Najdorf, era da Polônia e judeu. Então ele não quis voltar, ficou na Argentina. Então, da noite para o dia, ficou com 10, 20 dos melhores jogadores do mundo. Eliskases (Erich) e outros. Inclusive um deles veio para o Brasil, Ludwig Engels. Morou em São Paulo, morreu até aqui. Mas a maioria ficou na Argentina. Então o xadrez na Argentina se desenvolveu muito. O Che Guevara quando criança chegou a jogar uma simultânea com Najdorf, era ex-campeão argentino, e na Revolução Cubana ele (Che) jogava xadrez na guerrilha. Isso eu conto muito no meu livro, as estórias de Che Guevara, jogando xadrez na guerrilha. O curioso é que quando os cubanos tomam o poder, eles também introduzem o ensino do xadrez nas escolas. Então hoje Cuba é o único país da América onde isso é totalmente massificado, qualquer cubano sabe jogar xadrez, qualquer cubano de 40, 50 anos sabe jogar xadrez, porque desde o início da Revolução cubana, em 59, tem ensino do xadrez nas escolas.

P - No caso do Che Guevara, o senhor acha que o tipo de tática que ele fazia, e usava para a guerrilha, é influenciada pelo xadrez?

HC - Não tenha a menor dúvida! Quando ele dizia, por exemplo, que "era preciso criar 1, 2, 3 Vietnãs para combater o imperialismo", essa é uma noção de jogo de xadrez. Como você planeja uma partida de xadrez? Você tem que ver onde estão as casas fracas e nunca deve se concentrar nunca em uma ameaça só. Você deve criar vários pontos de ameaça para enfraquecer o adversário, isto é, uma tática do jogo de xadrez. Quando ele dizia que era preciso criar várias guerrilhas, ele próprio foi para o Congo, criar uma guerrilha lá. Depois ele foi para a Bolívia, onde morreu. A visão dele era que o imperialismo norte-americano era um adversário que tinha que ser desgastado. E isso é uma forma de jogar xadrez, quando você está jogando contra um adversário mais forte, você tem que fazer pequenas guerrilhas no tabuleiro para ir enfraquecendo, você tentar uma casa fraca e tudo mais. Tem tudo a ver não só com a política e a guerrilha, como a estratégia militar de uma maneira geral. Não por acaso, Napoleão era um apaixonado por xadrez, e tido como o maior gênio militar que o mundo conheceu. E gostava, inclusive, de jogar com os cavalos.

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